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terça-feira, 9 de outubro de 2018

New York Times: A democracia do Brasil pode ser salva?, por Robert Muggah



Jornal GGN - Em artigo no The New York Times, Robert Muggah, co-fundador de um think tank no Rio de Janeiro, aborada a ascensão de um perigoso populista de direita que ataca a divisão e a desunião, e que parece estar indo para a presidência. 
Muggah lembra que somos a quarta maior democracia do mundo e estamos às voltas com este problema. O ex-capitão obteve mais de 46% dos votos durante a primeira rodada das eleições presidenciais. O autor aponta para o fato do capitão enfrentar o segundo colocado, Fernando Haddad, do PT, em um segundo turno no dia 28 de outubro. Haddad conseguir apenas 27% dos votos e, mesmo que todos os outros candidatos esquerdistas e centristas o endossem, ele lutará para parar a ascensão de Bolsonaro.


Os brasileiros estão frustrados, desiludidos e zangados, aponta Muggah. E os protestos, que datam de antes da ascensão de Bolsonaro, vinham acontecendo contra a política cínica, a corrupção crescente, a estagnação econômica e os níveis de criminalidade de 'tirar o fôlego'. E, embora as pesquisas indiquem que a maioria dos brasileiros apoia a democracia, está-se mais desunido do que nunca. Mais da metade admitiu que iria apoiar um governo não-democrático se 'resolvesse problemas'. E lembra que Bolsonaro está neste contingente, já que declarou que não aceitaria o resultado de uma eleição onde ele não seja declarado vencedor.

Para Muggah, a democracia do Brasil está oscilando no limite, mas seu colapso não é inevitável. Seu rejuvenescimento exigirá visão, humidade, tolerância e coragem para enfrentar o que parecem ser diferenças intransponíveis. Para ele, não importa quem vença a segunda rodada, as próximas semanas e meses verão o aprofundamento da polarização e o aumento do ódio. Isso não torna menos importante a busca de um meio termo progressivo e soluções reais para os problemas do Brasil, diz ele.
A eleição ressalta a escalada da política de divisão do Brasil, considera. A polarização política do país é profundamente pessoal, atravessando idade, gênero e classe. Muitos estão abertamente se perguntando se seus pais, irmãos ou colegas, que apoiaram Bolsonaro, eram sempre autoritários. E aqueles que não o apoiaram estão visivelmente nervosos, temerosos do ressentimento violento que sua campanha desencadeou.
O sucesso de Bolsonaro se deve muito ao seu poder de dividir, considera Muggah. Muitos de seus principais seguidores - especialmente os jovens que compõem sua base - estão comprometidos com sua cruzada contra a corrupção e o combate ao comunismo. Outros, incluindo mulheres de classe média, são atraídos mais estreitamente por sua mensagem 'dura no crime'. E parte da elite empresarial do país vê em Bolsonaro - juntamente com seu companheiro de chapa, o general aposentado do Exército Antônio Hamilton Mourão, e seu consultor financeiro pró-mercado, Paulo Guedes - um baluarte contra o retorno do Partido dos Trabalhadores, de esquerda, e de seu líder hoje preso, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Os três principais partidos políticos do Brasil compartilham a culpa pela fragmentação do país. Tanto Lula quanto sua sucessora, Dilma Rousseff, invocaram regularmente a retórica 'nós contra eles' durante seus 13 anos no poder, especialmente quando confrontados com os crescentes escândalos de corrupção descobertos pelas investigações da Operação Lava Jato. Os outros dois partidos principais, PMDB e PSDB, também colocaram o Brasil em rota de colisão quando votaram pela destituição de Dilma Rousseff, em agosto de 2016. Descrita pelos partidários de Dilma Rousseff como um golpe ilegal, o impeachment dividiu ainda mais os brasileiros.
No entanto, diz Muggah, é Bolsonaro quem representa a maior ameaça à manutenção da democracia do Brasil. Ele prometeu alegremente limpar Brasília e restaurar violentamente a lei e a ordem. Mas os brasileiros devem dar uma boa olhada em seu histórico à medida que o segundo turno se aproxima: depois de cumprir sete mandatos ao longo de quase três décadas, primeiro como membro do Conselho da Cidade e depois como congressista, ele entregou apenas dois projetos. Enquanto ele claramente tem as credenciais para liderar uma reação autoritária, muitos duvidam que ele tenha as habilidades para governar em um ambiente multipartidário que depende da construção de coalizões.
Bolsonaro e seu companheiro de chapa são orgulhosos apologistas da ditadura militar que reinou de 1964 a 1985, diz Muggah. Ele disse uma vez que sua única falha era não ter matado mais pessoas. Sua equipe também apóia a repressão violenta ao crime: ele apóia abertamente a expansão dos poderes policiais para o uso de força letal, reduzindo a idade da responsabilidade penal de 18 para 16 anos e trazendo de volta a pena de morte. Ele defende maior envolvimento religioso na vida pública, aponta Muggah. No ano passado, ele declarou que o Brasil é um país cristão, que não existe tal coisa como um estado laico, e aqueles que discordam devem sair ou se curvar à maioria. Lembra ainda que ele recebeu repetidas denúncias do procurador-geral por propagação do discurso de ódio e é abertamente hostil às comunidades afro-brasileiras, populações indígenas emembros de movimentos sem terra, que ele descreveu como terroristas.
Os brasileiros podem abraçar a política de divisão e o apelo sedutor de soluções simplistas, seguindo o caminho de autoritários populistas da Hungria, Polônia e Filipinas. Alternativamente, eles podem preservar e renovar sua jovem democracia, finaliza.